EM Drive e Propulsão Não-Newtoniana
ROCK ON leitores! Alô? Alô? Planeta Terra, Planeta Terra, Planeta Terra chamando…
Alô? Esta é mais uma edição do diário de bordo de Lucas Silva e Silva, diretamente do Mundo da Lua!
Já imaginou podermos viajar pelo espaço em velocidades próximas à da luz, sem depender de combustão nem propulsores? Isso poderia ser possível com um EM Drive! Ou será que poderia mesmo?
Desde a famosa publicação do laboratório do Laboratório de Física de Propulsão Avançado da NASA, o Laboratório de Eagleworks entusiastas da exploração espacial tem especulado muito sobre o EM Drive. Este dispositivo é um cilindro cônico de cobre com duas extremidades planas. Dentro deste, um campo de radiação ressonante é induzido para que então microondas possam refletir entre as extremidades.
Fig. 1 – O EM Drive em teste.
O dispositivo foi inventado por Roger Shawyer, em 1999, e propostas similares seguiram sua publicação – mais notavelmente, o drive de Guido Fetta Cannae. Estes se enquadram na família de propulsores de cavidade ressonante de microondas. Eles propõem que o impulso, uma força resultante na direção da extremidade maior do drive, possa ser causada extraindo o momento (impulso) do campo de radiação interno, mas sem propulsor.
Fig. 2 – Microondas causando impulso não-newtoniano
Isso seria bastante revolucionário, porque os motores de foguetes convencionais são fundamentalmente limitados pelo fato de que eles têm que transportar uma fonte de energia (combustível) e um propulsor que impulsione este monte de massa para fora da extremidade traseira, empurrando um foguete pra frente. A lei da conservação do momento exige isso.
Mas como funciona esse impulso não-newtoniano?
Roger Shawyer explica o impulso do EM Drive como resultante da pressão de radiação diferencial entre as duas extremidades. Jim Woodward, da CalTech, contrapõe esse argumento de forma análoga: seria como tentar acelerar um carro, sentado no banco do motorista, empurrando o pára-brisa pra frente. Ou seja, esta explicação viola a lei da conservação de momento. A menos que esses fótons possam realmente escapar da cavidade do drive, então qualquer troca de momento entre a cavidade e o campo de radiação seria novamente distribuído pelo interior do drive, já que o sistema é fechado. E se os fótons escapam, então temos um propulsor de fótons, como qualquer outro propulsor já conhecido. O impulso que produziríamos é minúsculo, e muito menor do que o impulso que Shawyer relatou quando ele testou seu próprio EM Drive.
O resultado publicado por Eagleworks é o mais recente em várias tentativas de reproduzir a medida de Shawyer, nenhuma das quais está perto de ser conclusiva. Eagleworks em si já tinha testado o dispositivo à pressão atmosférica e encontrou um impulso positivo. A principal crítica de todos os testes em ambiente não-vácuo é que a convecção térmica pode ter produzido o impulso observado. Seria o mesmo que fazer um microondas daqueles que temos em casa; o ar interior se aquece e sua expanção é direcionada pelo formato do drive. Mas o último teste foi em uma câmara de vácuo com um décimo de bilionésimo da pressão atmosférica do nível do mar, onde praticamente nenhuma convecção é possível.
Fig 3. – Medição térmica
O impulso foi testado com um balanço de torção: um fio de metal rígido em que o dispositivo é pendurado com um contrapeso. A torção do fio dá uma medida extremamente precisa de qualquer força. Os autores reivindicam um impulso positivo na direção esperada em todos os níveis de potência, e esse sentido inverteu quando a orientação do dispositivo foi trocada, como esperado. As pressões foram relatadas como as mesmas observadas num ambiente não-vácuo. A potência média de impulso para entrada observada foi de cerca de 1,2 mili-Newton por quilowatts. Isso é muitas vezes menor do que os impulsos relatados por experimentos de Shawyer. Mas ainda é muito maior do que propulsor de fótons produziria, eliminando este contra-argumento.
Fig. 4 – Teste e medidores de impulso
1 milliNewton por kiloWatt levaria em torno de 1 gigawatt de potência para levitar um humano médio. Precisaríamos de uma usina nuclear comercial para conseguir essa potência. Mas a eliminação da necessidade de propulsores significaria que a relação poder-propulsão é útil para vôo espacial de muito longo alcance. Todavia, este relatório é problemático. Os autores sugerem uma resposta consistente e encaixam uma linha reta no gráfico de empuxo-vs-poder. No entanto, é realmente claro que os 60 e 80 watts são estatisticamente equivalentes e há uma enorme dispersão. Essa linha reta é enganosa!
Fig 5. – Mostrando resultados e linha (pontilhada) mencionada
Dito isto, o deslocamento positivo ainda parece estatisticamente significativo. Logo, já podemos dizer que o EM drive gera impulso? Não até que todas as outras possíveis explicações sejam descartados. Por exemplo, os efeitos térmicos ainda poderiam explicar as medidas relatadas por causa da possível deformação do dispositivo e a escala de sua expansão térmica. Um teste simples seria aquecer o dispositivo sem campo de radiação e ver se esse aquecimento produz um sinal semelhante, um falso-positivo – o que ainda não foi feito. Os autores identificam várias outras possíveis explicações, e fazem argumentos razoáveis contra elas, ou propõem testes para descartá-las. Antes que possamos acreditar que o impulso do EM Drive é real, esses testes precisam ser feitos. Qualquer resultado que requer uma explicação física nova e exótica exige que todas as causas mundanas sejam exaustivamente eliminadas além da dúvida “razoável”.
O artigo invoca a Teoria da Onda Piloto como uma forma de justificar o tratamento do vácuo quântico como uma espécie de plasma, que poderia ser usado como um propulsor. No entanto, é altamente especulativo e não é necessariamente um resultado Teoria da Onda Piloto. Em dois trabalhos separados, Harold White executa simulações de computador que ele argumenta demonstrar que esse meio pode produzir certos efeitos quânticos observáveis, como os níveis de energia do átomo de hidrogênio. Se o vácuo é esse tipo de meio quase clássico, então eles argumentam que o impulso EM poderia empurrá-lo, deixando um rastro de vácuo degradado por trás dele. No entanto, nada disso é relevante a menos que se prove que o vácuo é algo muito diferente do que é descrito pela teoria do campo quântico, e esta foi até agora muito bem sucedida em descrever e prever fenômenos naturais.
Muito provavelmente, os resultados relatados pela NASA serão provados falsos-positivos. A segunda explicação mais provável é que eles serão explicáveis com algum argumento da física atual, mas ainda não bem elaborado. Uma terceira possibilidade distante é que o resultado depende de uma física inteiramente nova, como esta do material de vácuo quântico. Temos que estar abertos para esta possibilidade, mas tratá-la com o mérito mínimo que ainda tem. Ainda assim, a comunidade científica está ansiosa para Eagleworks e outras equipes chegando ao fundo dela.
ROCK OFF!
Fontes:
Measurement of Impulsive Thrust from a Closed Radio-Frequency Cavity in Vacuum” – White, March, Lawrence, Vera, Sylvester, Brady & Bailey, 2016. Abstrato. PDF.
Texto adaptado do vídeo The EM Drive: Fact or Fantasy? – 11 de Janeiro, 2017, por PBS Space Time; escrito e apresentado por Matt O’Dowd, produzido por Rusty Ward, edição de Grayson Blackmon, feito por Kornhaber Brown.